Falemos hoje de justiça. Falemos do último reduto da
soberania do estado em territórios longínquos, nestes nossos territórios do
interior, do distrito de Viseu, mas não diferente de tantos outros distritos.
O distrito de Viseu tem, neste momento, ainda, dezassete tribunais.
E, este governo, do PSD e do CDS, começou há dois anos, a pretexto de uma
reforma da organização judiciária, que ninguém percebe e desenvolvida nas
costas de toda a gente, por propor o encerramento de seis tribunais, depois
passou a propor nove, depois regrediu para sete tribunais. Os critérios
subjacentes a esta reforma, como se vê, foram muito flexíveis! Deslizaram com
muita velocidade, até que a lei que veio a ser publicada em agosto de 2013,
absorveu um novo critério, o critério das “eleições autárquicas” e, nessa lei, nenhum
tribunal era proposto para encerrar, cabendo essa tarefa a um decreto-lei do
governo a publicar posteriormente.
Portanto, como se percebe, coerência e estudo minucioso é
coisa que não falta nesta reforma judiciária, face a tanta e tanta ponderação
de pormenores!
E isto mesmo, este exercício de filigrana jurisdicional, foi
percebido pelos deputados do PS, em reuniões que efetuaram em todo o distrito, com
representantes das mais diversas instituições, nos últimos dois anos:
autarquias, advogados, magistrados. Todos convergiram na desnecessidade desta reforma
absurda e com critérios sem qualquer ratio.
Ou dito de outro modo, os detalhes e as minúcias dos critérios tiveram a ver
com tudo menos com qualquer ideia de reforma da organização judiciária!
A tudo isto o PS sempre se opôs e votou contra a lei 62/2013
publicada no dia 26 de agosto. Para o Partido Socialista o que faz sentido não
é encerrar tribunais, não é deslocar populações, o que se justifica, em nome da
justiça e da coesão territorial, é deslocar os magistrados. Ganharíamos todos,
a começar pelo próprio estado, se esta fosse a opção tomada.
Mas vamos aos factos!
O anteprojeto de decreto-lei que está/esteve em discussão, a
que tivemos acesso, que este governo apresenta, prevê o encerramento, em
concreto, dos tribunais de Armamar, Castro Daire, Oliveira de Frades, Resende,
São João da Pesqueira, Tabuaço e Vouzela, para além das deslocações, imprevisíveis,
de populações de uns concelhos para outros. E não se venha dizer que em algum dos
concelhos, onde encerra o tribunal, pode haver secções de proximidade, que nada
mais são do que uma tentativa de “calmante”, mas sem qualquer conteúdo, para as
populações. Ou seja, aumentará, e muito, a interioridade, nestes nossos territórios
sem qualquer rede de transportes estruturada.
E aqui chegados, algumas perguntas se colocam para quem quiser
e souber responder: A troco de que ideia de coesão territorial e de justiça
quer este governo encerrar estes tribunais? Com quem foi dialogada esta
pretensa reforma da reorganização judiciária? O governo conhece, por acaso, as
serranias do Montemuro, Lapa ou Nave, Caramulo ou São Macário? A ministra
conhece os vales encaixados e profundos do Paiva e do Vouga, do Dão e do
Teixeira, ou do Távora e do Torto? E as encostas (lindas!) mas abruptas do
Douro?
Não conhecem, a não ser o calor artificial dos gabinetes do
terreiro do Paço.
Afinal, mais um rude golpe se prepara contra o interior, nas costas das populações!
(Nota: Artigo escrito antes da decisão de encerramento de tribunais, na reunião do conselho de ministros de 6.02.2104)
Afinal, mais um rude golpe se prepara contra o interior, nas costas das populações!
(Nota: Artigo escrito antes da decisão de encerramento de tribunais, na reunião do conselho de ministros de 6.02.2104)
Acácio Pinto
Correio Beirão, 2014.02.07, na p.24