![]() |
Estação da Figueira da Foz |
A linha da Beira Alta, entre a Figueira da Foz e Vilar Formoso, foi inaugurada com pompa e circunstância pelo Rei D. Luís no dia 3 de agosto de 1882, contando igualmente com a presença do Presidente do Conselho, de ministros e de inúmeras entidades civis, militares e religiosas.
Após várias vicissitudes, que não vêm agora ao caso, o troço
inicial entre a Figueira e a Pampilhosa (Ramal da Figueira da Foz) foi encerrado e desativadpo em 2009.
Regressando à inauguração vamos transcrever a descrição que
Bronislaw Wolowski — um jornalista possivelmente de origem polaca que escrevia
para um jornal francês — publicou sobre este evento num livro sob o título Les Fêtes en Portugal. Inauguration du chemin-de-fer de la Beira-Alta – Voyage de la famille royale. Notes de souvenirs de voyage. Desse livro, editado pela E. Dentu, de Paris, em
1883, reproduzimos de seguida uma tradução do capítulo “Pampilhosa – Figueira
da Foz”.
As festas oficiais
começavam verdadeiramente na Pampilhosa. A carruagem-salão real foi ao encontro
de Suas Majestades em Coimbra. A bênção das máquinas deveria ter lugar na
Figueira.
Na Pampilhosa, o comboio
parou cerca de meia hora, e foram apresentados ao rei todos os funcionários
superiores da Companhia.
Também aí esperavam os
membros do Conselho de Administração, com o empreiteiro geral, o Sr. D
Duparchy, que referi atrás.
Eis os seus nomes: Sr.
conde de Ficalho, Sr. Barahona de Freitas, antigo ministro da justiça, Sr. Eugénio
de Mendia e Sr. João Joaquim de Mattos, delegado do governo para a linha, do
Conselho de pontes e caminhos. O Sr. Serpa Pimentel, que faz parte do Conselho,
acompanhava o rei desde Lisboa, na sua qualidade de ministro dos negócios estrangeiros.
O calor era grande. As
pessoas juntavam-se na rua. Os agricultores dos arredores chegavam sem cessar.
A gare estava decorada
com as iniciais B.-A.
Às 7 da manhã, o
comboio real entra na estação [Pampilhosa] ao som da música. Depois do pessoal
superior da companhia ser apresentado ao rei — aqui convém acrescentar aos
nomes já citados, os do Sr. Labadie, engenheiro-chefe da via e o Sr. Pardal,
chefe de exploração — o comboio partiu na direção da Figueira, onde chegou às
9h 30 da manhã.
O bispo de Coimbra, um
belo homem, de um tamanho gigantesco, pôs as suas vestes sacerdotais e depois
das saudações habituais na rua, o rei e a rainha, seguidos dos príncipes e dos
convidados, subiram para o estrado preparado.
O presidente do
Conselho Municipal pronunciou um discurso ao qual o rei respondeu; depois, o
bispo tomou a palavra, longamente, muito longamente.
Depois da sua arenga,
o bispo deixou o cortejo e dirigiu-se ao local preparado para a bênção.
A seguir começou o
desfile das máquinas, ornamentadas com bandeiras, flores e verduras. As
bandeiras que decoravam as máquinas eram de três nações: portuguesas, italianas
e francesas. Italianas, em honra da rainha, filha do rei Victor Emmanuel, irmã
do rei Humberto. Francesas, porque a Companhia que explora a linha foi
construída por franceses, com capitais franceses.
As máquinas, do n.º 1
até ao n.º 20 inclusivamente, foram construídas em Creusot; depois, o n.° 21 e
demais, em Viena, na Áustria
A tribuna real,
coberta de um dossel em seda vermelha e decorada com as cores de Portugal,
tinha na frente duas tribunas cheias de senhoras elegantemente vestidas — e
verdadeiramente havia algumas bonitas, muito bonitas.
As tribunas foram
construídas de modo a não impedir totalmente a visão do público que estava massivamente
em frente da gare.
Que entusiasmo! A
vista era feérica. Estavam ali vinte mil pessoas. As carruagens reais, enviadas
de Lisboa, como em Coimbra, esperavam, e o percurso, numa distância de mais de
um quilómetro, é feito no meio de aclamações que me mostraram quanto o rei e a
rainha são populares e amados nas províncias.
A cidade da Figueira
está admiravelmente situada junto ao Mondego, que é majestoso na sua foz. As
ruas largas, limpas, enfeitadas, um enxame de bonitas mulheres, de belas roupas,
a variedade dos costumes: as pessoas do povo corriam lado a lado com as pessoas
urbanas, competindo com os cavalos que puxavam a carruagem real, tudo isso constituindo
um espectáculo de um pitoresco encantador.
Chegámos à catedral
para o Te Deum e daí ao partido dos progressistas, onde a municipalidade da
Figueira-da-Foz ofereceu um almoço em honra da visita de Suas Majestades. Havia
100 lugares.
O partido dos
progressistas está muito bem instalado. É uma casa espaçosa, um palacete,
cercado por um grande muro protegido por uma grade.
Na sala de jantar,
foram colocadas uma mesa real ao fundo e outra ao meio, onde tomaram lugar as pessoas
próximas do rei e as pessoas designadas pelo soberano. Os dois extremos foram
utilizados para as outras mesas.
Tive a vantagem de
ficar colocado em frente do presidente do Conselho de ministros. Sr. Fontes,
que tinha à sua direita o Sr. Mendes-Leal, e pouco mais longe, o Sr. Serpa
Pimentel, ministro dos negócios estrangeiros. Pude, graças ao protocolo, ter a
tradução do brinde que o rei pronunciou em resposta ao discurso de boas-vindas
do presidente do Conselho municipal.
Brinde do rei
Não é a primeira vez,
no meu reinado, que é proporcionado ao meu coração de rei de se juntar à
abertura de uma via nova. É um grande progresso para civilização.
Mas é a primeira vez
que venho ao coração desta laboriosa população da Figueira, à qual este
caminbo-de-ferro permite desenvolvimento industrial e comercial.
Graças ao trabalho
dedicado dos engenheiros do Estado e dos engenheiros da companhia, podemos
abrir a fronteira, que é uma fronteira de paz.
Estou feliz de fundir,
num mesmo brinde, o progresso e a prosperidade futura da Figueira e da províncıa
da Beira-Alta.
Pedimos de seguida
autorização a Sua Majestade para ler um texto em verso, dedicado por Henri de
Bornier ao rei D. Luís. Os leittores lê-lo-ão com o maior prazer.
Nota: O poema
referido, escrito em francês, era composto por oito estrofes de dez versos.
Fontes: Revista de História da Sociedade e Cultura n.º12 - 2012; Linha da Beira Alta, viagem inaugural - ACAB 2019.
Ler: CRÓNICA sobre a linha da Beira Alta.
Tamnbém pode ler AQUI