Quando me lembro da Feira de Castendo vêm-me de imediato à memória, por mais estranho que pareça, os tremoços e o berbigão. Isto porque sempre que o meu avô ia àquela feira (que se realizava e realiza às sextas-feiras) trazia aqueles dois produtos com que a pequenada lá de casa se deliciava. Os tremoços, comíamo-los com pão de milho, quanto aos berbigões, às escondidas da minha avó e da minha mãe, pois eram para fazer arroz, íamos roubá-los à bacia da água, onde estavam a abrir, e comíamo-los crus.
Ainda hoje
retenho na minha memória gustativa esses paladares de outrora.
Mas a grande
excitação foi quando lá fui a primeira vez. Teria uns dez ou onze anos. Foi no
início dos anos 70.
Apanhámos de
manhã cedo a carreira do Berrelhas em Douro Calvo e depois de passarmos pela
Silvã e por Rio de Moinhos, onde ela encheu, seguimos diretamente para Castendo.
Lá chegados,
o movimento no mercado, defronte da Câmara (hoje Loja de Cidadão) era tanto que
a minha mãe me agarrou na mão para que eu não me perdesse. Hortaliças de Rio de
Moinhos, galinhas, coelhos e tantos outros produtos da região estavam expostos
em bancadas por entre um emaranhado de pessoas que se acotovelavam e que quase
não conseguiam circular.
Sim, também
lá havia peixe, lembro-me de ouvir dizer que era o Roselo que o vendia, muitos
talhos e várias barracas de comes e bebes. Fiquei com água na boca com aquele
cheirinho que saía das brasas e das sertãs. Comer? Só mesmo o cheiro!
Mas a turba
não estava só no mercado. Quando fomos para o largo em frente da Igreja da Misericórdia
o formigueiro continuava. Eram tendas e mais tendas. Sapatos, roupas,
ferramentas e quinquilharias diversas.
A ALFAIATARIA DO SENHOR GENÉSIO
E era,
precisamente, na lateral desse largo que o senhor Genésio, cujo nome eu já
conhecia há alguns anos, tinha a sua alfaiataria. As roupas dos domingos e dos dias santos, do
meu avô e dos meus tios, eram feitas por ele, depois de se submeterem às medições da sua fita métrica. A altura das pernas, a medida da cintura, a largura das costas, as mangas…
Tudo, depois de medido a rigor, era apontando num desenho que ele fazia num
livro igual aos que havia nas tabernas com o rol dos caloteiros.
Tinha
chegado a vez de também me tirarem as medidas a mim. Tinha sido esse o
verdadeiro motivo da minha ida à feira. A Páscoa aproximava-se e o rapaz que já
tinha feito o exame da quarta classe e andava no colégio tinha de ter um fato
feito por um alfaiate, ouvia eu dizer. Até essa altura era a minha mãe que me
confecionava a roupa numa máquina de costura Oliva, para poupar nas despesas. Nessa época o meu pai andava em França.
Após todas as 'meças' de que fui alvo era a hora de escolher o pano. Sei que o senhor Genésio colocou várias
peças de tecido em cima do balcão e me perguntou de qual é que eu mais gostava,
mas creio que a decisão final não foi minha.
Depois lá
fomos comprar os tremoços e o berbigão… e regressámos a casa por volta do
meio-dia, onde a minha avó já tinha o 'jantar' na mesa.
NOTA: A vila de Castendo passou a
denominar-se Penalva do Castelo a partir de 1957 (Decreto 41222 de 7 de agosto),
embora o nome perdurasse por bastantes mais anos.
Acácio
Pinto, 4 de setembro de 2025