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A propósito de comboios na Beira Alta: Cansados de esperanças vãs.

 


A 3 de agosto de 1882 foi dia grande para as gentes da Beira, com a inauguração da linha ferroviária que haveria de vir a ligar Portugal à Europa a partir de Vilar Formoso e que tomou o nome de Linha da Beira Alta. Primeiro desde a Pampilhosa e depois desde a Figueira Foz.

E uma grande obra teria de ter, como teve, nesse longínquo ano, as mais gradas figuras do país. Precisamente o rei D. Luís e a sua família mais chegada para além dos ministros e conselheiros. O povo, esse, saiu à rua para aclamar e aplaudir.

Porém, volvidos que são todos estes anos, faz hoje 142, aqui estamos nós, depois de tantos prometimentos, ainda sem a reabertura de uma linha que nos foi dito que era para estar requalificada e em pleno funcionamento já há muito tempo. Aqui estão os cidadãos de toda esta vasta região, entregues a indecisões, a intermitências, a retóricas ao sabor de todo o tipo de eleitoralismos.

De inconseguimento em inconseguimento, os portugueses em geral e os desta alargada beira em particular, de Aveiro a Viseu até à Guarda, (des)esperam, há mais de vinte anos, ao som das cornetas que por aí vão entoando hinos de hipocrisia e de cinismo.

Já chegaria, há muito tempo, de epístolas demagógicas. De proclamações sem conteúdo. Todavia, elas continuam, como se cada um dos seus intérpretes estivesse a anunciar o alfa e o ómega para o futuro do nosso viver em comunidade.

Primeiro era novembro, depois abril, depois outro mês qualquer. Qualquer um servia para nos lançar poeira para o caminho.

Já foi alta velocidade, já foi Aveiro-Viseu-Salamanca, já foi ramal de Viseu, já foi sabemos nós lá mais o quê. O que sabemos é que nem esta requalificação, em bitola ibérica (!?), com que nos querem entreter, colocam ao serviço da economia portuguesa. Quanto mais o resto!

Isto nada tem a ver com o agora, ou com um ontem mais próximo e também não é um elogio à monarquia, como poderá parecer pela citação inicial.  Não, isto tem a ver com o desrespeito sistemático dos mesmos (dos detentores do poder central e centralista) para com os mesmos de sempre (os cidadãos e os contribuintes deste interior, objetivamente, votado ao abandono).

Merecíamos melhor sorte!

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