Avançar para o conteúdo principal

(Opinião) Tergiversações

As surpresas nesta campanha têm sido mais que muitas. Mas a essência de todas elas radica no facto de nenhum dos partidos, que chumbaram o PEC IV e assim lançaram o país nesta crise, ter qualquer programa, qualquer ideia para a governação. Aliás, como se viu. Só agora, há escassos dias, apresentaram umas ideias inconsistentes a que chamaram programa de governo.
Nenhum estava, afinal, verdadeiramente preparado em termos programáticos (para não falar de lideranças, que respeito) para avançar para o poder. Aliás, se assim não fosse, o que se exigia era que, logo, no dia 23 de Março, quando fizeram, liderados pelo PSD, aquela nefasta coligação multipartidária para deitar o Governo abaixo, apresentassem as políticas alternativas, os modelos diferentes e o rumo que eles defendiam para a ultrapassagem desta crise internacional em que estamos, todos, envolvidos.
Mas não. Foram muito rápidos a destruir, a deitar abaixo, mas estão a ser muito lentos, muito tolerantes e muito flexíveis (quem diria!) a construir.
O PSD deu-se ao luxo, até, de dar férias ao seu principal negociador económico. Parece que foi para os trópicos descansar, escassos meses após o início do seu trabalho. Mas aquelas suas entrevistas à velocidade do som eram “ interessantíssimas”, para já não falar das suas mudanças de ideias e de números que ele fazia à velocidade da luz e da sua falta de respeito para com os adversários políticos. Era a TSU a 4% numa e a 8% noutra; era o IVA a 24% ou 25%; era o fim da taxa intermédia do IVA…
Esta foi e é, efectivamente, a especialidade do PSD: dizer tudo e o seu contrário no momento seguinte.
Mas o exemplo mais paradigmático estava guardado para Pedro Passos Coelho.
Na sequência das críticas de Santana Castilho, ao programa recente do PSD para a educação, Passos Coelho admitiu logo alterá-lo. Ora isto não é liderança, não é convicção, isto é falta de estratégia, isto é falta de visão, isto é incompetência política.
Parafraseando Séneca, nunca haverá bom vento para quem não sabe para onde quer ir.
Mas as surpresas vieram também do lado do CDS. Foi o último a apresentar o seu programa e, inclusivamente, quando foi para um debate com José Sócrates sobre o futuro, sim sobre o futuro, só a sua mente tinha o programa. E como se isso não bastasse ainda levou um gráfico que ele (re) inventou. Ou seja, como a estatística não lhe dava razão, vai de decepar países do gráfico original para que Portugal fosse o pior dos países apresentados. Então era lá possível que Portugal não estivesse em último lugar?
Ora isto não é fazer política séria. Ora isto é “estalinismo” do mais puro e duro. Quando a realidade e a história não nos obedecem, nós reescrevemo-la.
Poderia ainda falar, desenvolvidamente, dessa nova deriva de Passos Coelho contra o Programa Novas Oportunidades, sobre a afronta que ele está a fazer a mais de meio milhão de portugueses que dele já usufruíram, mas sobre isso só deixo as palavras de Cavaco Silva “É com muito gosto que (…) me associo à cerimónia simbólica da entrega de certificados aos adultos que obtiveram o reconhecimento, a validação e a certificação das suas competências no âmbito do Programa Novas Oportunidades.”
As tergiversações nunca foram boas conselheiras. Temos que ter um rumo e uma ideia clara para defender Portugal.

Mensagens populares deste blogue

Sermos David e Rafael, acalma-nos? Não, mas ampara-nos e torna-nos mais humanos!

  As palavras, essas, estão todas ditas. Todas. Mas continua a faltar-nos, a faltar-me, a compreensão. Uma explicação que seja. Só uma, para tão cruel desenlace. Da antiguidade até ao agora, o que é que ainda não foi dito? O que é que falta dizer? Nada e tudo. E aqui continuamos, longe, muito distantes, de encontrar a chave que nos abra a porta deste paradoxo. Bem sei que, quiçá, essa procura é uma impossibilidade. Que não existe qualquer via de acesso aos insondáveis desígnios. Da vida e da morte. Dos tempos de viver e de morrer. Não existe. E quando esses intentos acontecem em idades prematuras? Em idades temporãs? Tenras? Quando os olhos brilham? Quando os sonhos semeados estão a germinar? Aí, tudo colapsa. É a revolta. É o caos. Sermos David e Rafael, nestes tempos cruéis, não nos acalma. Sermos comunidade, não nos sossega. Partilharmos a dor da família, não nos apazigua. Sermos solidários, não nos aquieta. Bem sei que não. Mas, sejamos tudo isso, pois ainda é o q...

Frontal, genuíno, prestável: era assim o António Figueiredo Pina!

  Conheci-o no final dos anos 70. Trabalhava numa loja comercial, onde se vendia de tudo um pouco. Numa loja localizada na rua principal de Sátão, nas imediações do Foto Bela e do Café Sátão. Ali bem ao lado da barbearia, por Garret conhecida, e em frente da Papelaria Jota. Depois, ainda na rua principal, deslocou-se para o cruzamento de Rio de Moinhos, onde prosseguiu a sua atividade e onde se consolidou como comerciante de referência. Onde lançou e desenvolveu a marca que era conhecida em todo o concelho, a Casa Pina, recheando a sua loja de uma multiplicidade de ferramentas, tintas e artefactos. Sim, falo do António Figueiredo Pina. Do Pinita, como era tratado por tantos amigos e com quem estive, há cerca de um mês e meio, em sua casa. Conheceu-me e eu senti-me reconfortado, conforto que, naquele momento, creio que foi recíproco. - És o Acácio - disse, olhando-me nos olhos. Olhar que gravei e que guardo! Quem nunca entrou na sua loja para comprar fosse lá o que fosse? Naquel...

Ivon Défayes: partiu um bom gigante.

  Ivon Défayes: um bom gigante!  Conheci-o em finais dos anos oitenta. Alto e espadaúdo. Suíço de gema. Do cantão do Valais. De Leytron.  Professor de profissão, Ivon Défayes era meigo, afável e dado. Deixava sempre à entrada da porta qualquer laivo de superioridade ou de arrogância e gostava de interagir, de comunicar. Gostava de uma boa conversa sobre Portugal e sobre a terra que o recebeu de braços abertos, a pitoresca aldeia do Tojal, que ele adotara também como sua pela união com a Ana. Ivon Défayes era genuinamente bom, um verdadeiro cidadão do mundo, da globalidade, mas sempre um intransigente cultor do respeito pela biodiversidade, pelo ambiente, pelas idiossincrasias locais, que ele pensava e respeitava no seu mais ínfimo pormenor. Bem me lembro, aliás, das especificidades sobre os sons da noite que ele escrutinava, vindos da floresta, da mata dos Penedinhos Brancos – das aves, dos batráquios e dos insetos – em algumas noites de verão, junto ao rio Sátão. B...