Desde a antiguidade que somos um povo de marinheiros. Um povo com vocação marítima. Ou não vivêssemos nós paredes meias com o mar imenso. Com essa autoestrada sem fim que outrora nos levou até aos novos mundos do Mundo.
Somos um jardim à beira mar plantado neste sudoeste da
Europa continental. Um território com múltiplos pés espalhados pelo oceano, que
se nos oferta defronte, quais atlânticos arquipélagos tão nossos, quanto este retângulo
tão deles. Uma terra múltipla e com uma alma infindamente grande.
Podemos afirmar que somos uma nação milenar e una. Tão una!
Sem ruturas identitárias. Com uma identidade plena. Todos identificados com os
seus mais fortes símbolos. Simbolismos. Hino. Bandeira. Quiçá, cultura. Dentro
da qual todos cabemos, à vontade.
No passado, longo de séculos, fomos mais monárquicos. Hoje somos
mais republicanos. Ontem estivemos subjugados e oprimidos. Agora vivemos sob os (bons) ditames do voto livre. Fomos governados por aqueles. E nestes tempos de prosa
dura temos os destinos geridos por estes. Ontem como hoje, fomos e somos
pessoas que dimanaram das revoluções, dos sufrágios ou dos múltiplos fóruns da nossa
polis.
E durante este tempo longo e comprido que levamos, todos somos e estamos radicados nos nossos ancestrais. Nos lusitanos, para não ir mais além. Em Viriato, imortal. Em Henriques ou Henrique, rei ou infante. Em Vasco ou Cabral. Na Índia
ou no Brasil. Em África ou Oriente extremo. Em todos. Com todos.
Com erros? Tantos. Com heresias? Muitas. Com perseguições?
Quantas efetuámos cá dentro e lá fora. Aos nossos e aos outros.
É que não há História pura. Depurada. Nenhuma o é.
Correm-nos no sangue, hoje ainda, as trovas antigas, ou as
sátiras vicentinas. As palavras dos reais cronistas ou os decassilábicos versos
épicos de Camões. Os ideais dos iluministas. A subjetividade dos românticos ou as
fotografias sociais dos realistas. Os modernistas e a busca de novas
linguagens. E os olhares dos neorrealistas para a pobreza e para os desvalidos.
Tudo isto fomos. Tudo isto somos.
Uma síntese de tantas idiossincrasias. Um todo de que nos
deveríamos orgulhar. E bem sei que orgulhamos. Sem ressentimentos. Sem
querermos ajustar contas. Com o passado. Com esse ido ontem.
Pois bem, então sejamos. Mas sejamos com liberdade e tolerância.
Acácio Pinto 10 de junho de 2025