Há idades em que já não é fácil sermos surpreendidos. Porém,
há dias, deslocámo-nos a uma casa anunciada como de petiscos e mercearia, em
Viseu, onde andávamos para ir há algum tempo. E andávamos para lá ir, veja-se
bem, pelo seu nome. Aquela coisa de Meio Sustento andava a martelar-nos a cabeça.
Meio-sustento-meio-sustento!
Não tínhamos nenhuma recomendação, nem quaisquer referências
sobre a qualidade dos petiscos/pratos ali cozinhados e servidos.
Só uma evidência nos poderia satisfazer a curiosidade e,
portanto, pés a caminho.
Desde logo apreciámos o espaço. A forma como está
organizado. Uma área inicial de exposições, com conservas, doçaria diversa e
vinhos. Produtos múltiplos que nos enchem a mancha visual e nos obrigam a
passar devagar pois o nosso palato começa-nos a refrear a marcha ante os
imaginários paladares que nos vêm à boca. Depois, no interior, com um peculiar
biombo/separador, passamos à sala dos petiscos/refeições, com uma decoração
simples e sem exuberâncias, mas adequada, com base em imagens ligadas ao vinho.
O mobiliário, esse, diremos que é austero, porém sem deixar
por mãos alheias a aparência acolhedora e o conforto no uso. Sobretudo os
móveis das exposições que se nos impõem com um design singular, de um tosco
cativante!
Bem e se é (só) meio sustento, como será a quantidade, e já
agora, a qualidade da comida, ou não seja esse o elemento determinante em casas
de petiscos, de refeições ou de pasto, como antigamente se dizia? Ou não fosse
esse, também, o leitmotiv para esta nossa incursão.
Pedimos moelas, primeiro, e brás de alheira logo após.
Primeira surpresa. A quantidade e preço da dose de moelas
que nos era apresentada. Qual meio sustento qual quê! Segunda surpresa. A
qualidade do produto. As papilas rejubilaram com a textura das ditas e com o
tempero. No ponto ou na mouche, como se queira, bem como o pão para encharcar naquele
molho de três assobios!
Mas as surpresas não se ficaram por aqui. Renovaram-se com o
brás de alheira nos mesmos termos, com a quantidade, neste caso, a afastar-se
ainda mais do meio sustento.
Quanto ao vinho, optámos pelo branco da casa. Era do Dão, de
um produtor que sabe da poda! Encorpado e frutado. Paladar delicioso, depois de
bem esmiuçado.
Meio sustento? Pois, só mesmo no nome!
Questionámos, como-quem-não-quer-a-coisa, o proprietário,
José Carlos Pereira, e percebemos que por detrás de tudo isto esteve a paixão
pela cozinha e uma vontade de abraçar este projeto, um projeto que lhe desse
felicidade e o libertasse das algemas dos prazos e regulamentos de outrora, de
plataformas implacáveis e sem rosto de um estado, quantas vezes, nada amigo do
cidadão.
Claro que voltaremos, para almoçar ou petiscar. Queremos ser
surpreendidos pelo arroz de pato, pelas pataniscas, chouriça, queijos e
sei-lá-mais-o-quê!
Mais não digo! Vão ver, é atrás do Tribunal de Viseu e se
estiver calor e quiserem, terão sombra na esplanada.
Nota: Penitenciamo-nos por só lá termos ido em 2023, seis
anos após a sua abertura.
Acácio Pinto | Agosto de 2023
