Avançar para o conteúdo principal

Entrevista com Vasco Rodrigues (parte II): 'O bar METRO E MEIO é um bar mítico da cidade de Lisboa'

ENTREVISTA PUBLICADA EM ABRIL DE 2016 - Jornal DÃO E DEMO
Tem 52 anos de idade, é natural de Ferreira de Aves, concelho de Sátão, e está radicado em Lisboa desde 1977, para onde foi trabalhar com 14 anos de idade, para um restaurante de família, executando tarefas indiferenciadas, longe dos clientes.
Depois foi sempre em frente, fruto de uma “genica beirã”, como ele diz, foi assumindo diversas funções até que aos 18 anos já era encarregado e aos 20 anos avançou para um restaurante em sociedade, passou por outros negócios e hoje tem uma dos restaurantes de referência nas imediações da avenida da República, em Entrecampos, a pastelaria e restaurante CINDERELA e tem ainda um dos bares mais simbólicos da capital METRO E MEIO, na avenida 5 de outubro.
Falamos de Vasco Rodrigues, o convidado de DÃO E DEMO para uma entrevista sobre o seu percurso de vida.

Depois da publicação da parte I, onde falámos da ida de Vasco Rodrigues para Lisboa e do Restaurante CINDERELA, nesta PARTE II falamos sobre o IVA da restauração e sobre o bar METRO E MEIO

“Para uma grande parte dos restaurantes, pastelarias e cafés [o aumento do IVA] foi mesmo fatal”


DD: Como vai o negócio, neste ano da graça de 2016? Está a melhorar ou nem por isso?
VRAs expectativas são boas, o negócio tem vindo em crescendo, mas de maneira ainda um pouco tímida. Vamos esperar para ver o que nos reservam os próximos capítulos.
DD: O aumento do IVA para 23% causou dificuldades ao seu negócio?
VRMuitas, muitas mesmo. Para uma grande parte dos restaurantes, pastelarias e cafés foi mesmo fatal. Mais de 40% foram obrigados a encerrar por força da brutalidade da carga fiscal, essencialmente do IVA, que aumentou para o dobro, sem que nós pudéssemos aumentar sequer um café. Digo mesmo que o nosso restaurante não aumenta um único produto desde 2011, apesar da subida dos preços das matérias-primas, energia, água e outros. Eficazmente adaptámo-nos à situação, renovámos o restaurante, criámos condições para os clientes fazerem as refeições mais baratas e rápidas, criámos menus, pratos rápidos com menor quantidade. Isto é, demos a volta por cima, sem entrarmos naquela agonia em que muitos restaurantes entraram, despedindo funcionários, deixarem de pagar a fornecedores, pessoal, segurança social e outros impostos. Foram cinco anos duríssimos, muito maus para alguns.
DD: Vê com bons olhos o regresso do IVA aos 13%?
VREm 1992 tínhamos uma taxa de IVA de 8% que o governo de Cavaco Silva duplicou, tendo passado para 16%. Depois, em 1996, já com o governo de António Guterres e com a taxa a 17%, foi criada a taxa intermédia de 13%. Em 2012, o anterior governo, passou o IVA da restauração para a taxa no seu máximo histórico de 23%. Cerca de quatro anos depois, consegue voltar aos 13%. O aumento do IVA na restauração foi um erro crasso para o país, aumentar os impostos num setor que é 100% produzido em termos nacionais tem um efeito recessivo ampliado num setor que foi particularmente prejudicado no contexto da crise. Penso que, com a descida do IVA, vai haver mais criação de emprego na restauração, pois temos um turismo muito forte no nosso país.

“O bar “Metro e Meio” é um bar mítico da cidade de Lisboa”


DD: Mas o Vasco tem também uma outra casa conceituada em Lisboa, que é o bar “Metro e Meio” na avenida 5 de outubro, aqui próximo. Conte-nos como é que as coisas começaram aí?
VRO bar “Metro e Meio” é um bar mítico da cidade de Lisboa, que eu frequentava muitas vezes.
Como gostava de ter um bar, juntei o útil ao agradável: deixei de gastar dinheiro em outros bares e os meus clientes da “Cinderela”, no final de jantar, são encaminhados para o “Metro e Meio” para saborearem um copo até às tantas. Como estamos numa zona de poucos bares, a polícia não intervém regularmente em operações de controlo de álcool aos automobilistas, o que deixa os clientes um pouco mais à vontade.
DD: Quais os principais clientes do bar?
VRA clientela do “Metro e Meio” é muito diversificada, distinção que tem muito a ver com o espaço físico do bar e a sua história. Há clientes que o são desde sempre e há os que o têm descoberto e adotado como local preferencial para um estar agradável e confortável. Curiosa é a mistura entre jovens e menos jovens, o que confere ao “Metro e Meio” uma heterogenia difícil de igualar. Clientes principais? Não salientaria ninguém de entre figuras públicas, da política às artes, do desporto e da cultura e ao jornalismo, e gente anónima. Para mim todos são “principais” e importantes por distinguirem com a sua presença o “Metro e Meio”.
DD: Como vai o negócio dos bares em Lisboa, em geral, e o do “metro e meio” em particular?
VRNa zona dos bares de Lisboa, mais precisamente nas Docas, o negócio é muito bom. Na zona onde se encontra o “Metro e Meio”, marcadamente uma zona de serviços e pouco residencial tudo é mais calmo. Para uns, os mais velhos, continua a ser o “seu” bar de eleição, continuam fiéis, para outros, os mais jovens, talvez por se tratar de uma descoberta mais recente passou a ser o “bar da onda” que agora navegam. Como costuma dizer um amigo, o “Metro e Meio” passou a ser um “bar nunca dantes navegado”.
DD: Tem alguma história especial com algum seu cliente que nos queira contar, podendo omitir, se assim entender, o nome?
VRUm bar com tantos anos de existência terá, com certeza, sido palco de várias histórias. Alegres e tristes, com finais felizes e menos felizes. Tenho alguma dificuldade em eleger uma, prefiro, ao invés, salientar que todos quantos frequentam o “Metro e Meio” são os autores vivos da história do próprio bar. Todos eles, sem exceção, escrevem momentos e páginas de um bar que é uma referência em Lisboa, feito de tradição e modernidade, que é um convite não declinável para momentos de puro prazer, de conversa à solta, de tertúlias que fazem do convívio uma forma de estar na vida. Ali misturam-se, em simbiose quase perfeita, futebol e política, temas de diálogos arrebatadores e quase sempre interessantes. Ao “Metro e Meio” todos são bem-vindos.
DDMuito obrigado e felicidades.
Foto: Montagem Dão e Demo, com base no Google

Mensagens populares deste blogue

Sermos David e Rafael, acalma-nos? Não, mas ampara-nos e torna-nos mais humanos!

  As palavras, essas, estão todas ditas. Todas. Mas continua a faltar-nos, a faltar-me, a compreensão. Uma explicação que seja. Só uma, para tão cruel desenlace. Da antiguidade até ao agora, o que é que ainda não foi dito? O que é que falta dizer? Nada e tudo. E aqui continuamos, longe, muito distantes, de encontrar a chave que nos abra a porta deste paradoxo. Bem sei que, quiçá, essa procura é uma impossibilidade. Que não existe qualquer via de acesso aos insondáveis desígnios. Da vida e da morte. Dos tempos de viver e de morrer. Não existe. E quando esses intentos acontecem em idades prematuras? Em idades temporãs? Tenras? Quando os olhos brilham? Quando os sonhos semeados estão a germinar? Aí, tudo colapsa. É a revolta. É o caos. Sermos David e Rafael, nestes tempos cruéis, não nos acalma. Sermos comunidade, não nos sossega. Partilharmos a dor da família, não nos apazigua. Sermos solidários, não nos aquieta. Bem sei que não. Mas, sejamos tudo isso, pois ainda é o q...

JANEIRA: A FAMA QUE VEM DE LONGE!

Agostinho Oliveira, António Oliveira, Agostinho Oliveira. Avô, filho, neto. Três gerações com um mesmo denominador: negócios, empreendedorismo. Avelal, esse, é o lugar da casa comum. O avô, Agostinho Oliveira, conheci-o há mais de meio século, início dos anos 70. Sempre bonacheirão e com uma palavra bem-disposta para todos quantos se lhe dirigiam. Clientes ou meros observadores. Fosse quem fosse. Até para os miúdos, como era o meu caso, ele tinha sempre uma graçola para dizer. Vendia sementes de nabo que levava em sacos de pano para a feira. Para os medir, utilizava umas pequenas caixas cúbicas de madeira. Fossem temporões ou serôdios, sementes de nabo era com ele! Na feira de Aguiar da Beira, montava a sua bancada, que não ocupava mais de um metro quadrado, mesmo ao lado dos relógios, anéis e cordões de ouro do senhor Pereirinha, e com o cruzeiro dos centenários à ilharga. O pai, António Oliveira, conheci-o mais tardiamente. Já nos meus tempos de adolescência, depois da revolu...

Ivon Défayes: partiu um bom gigante.

  Ivon Défayes: um bom gigante!  Conheci-o em finais dos anos oitenta. Alto e espadaúdo. Suíço de gema. Do cantão do Valais. De Leytron.  Professor de profissão, Ivon Défayes era meigo, afável e dado. Deixava sempre à entrada da porta qualquer laivo de superioridade ou de arrogância e gostava de interagir, de comunicar. Gostava de uma boa conversa sobre Portugal e sobre a terra que o recebeu de braços abertos, a pitoresca aldeia do Tojal, que ele adotara também como sua pela união com a Ana. Ivon Défayes era genuinamente bom, um verdadeiro cidadão do mundo, da globalidade, mas sempre um intransigente cultor do respeito pela biodiversidade, pelo ambiente, pelas idiossincrasias locais, que ele pensava e respeitava no seu mais ínfimo pormenor. Bem me lembro, aliás, das especificidades sobre os sons da noite que ele escrutinava, vindos da floresta, da mata dos Penedinhos Brancos – das aves, dos batráquios e dos insetos – em algumas noites de verão, junto ao rio Sátão. B...